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Uns mais afim que outros, enquanto os outros nem sabem do aforismo
Dizer que este país concede apoios sociais aproxima-se vertiginosamente de uma blasfémia. A menos que o apoio resida somente no atendimento muleta, em forma de call-center, que hoje nos ajuda a perceber que se não nos dedicarmos à profissão mendigo, ou sejamos, por obra do acaso, um refugiado do inferno, o apoio social é apenas uma coisa bonita e fofinha para constar no auto deste magnífico estado social.
A minha experiência, não é um filme, mas podia ser dada a sequela que se lhe apresentou. Mas vamos por actos:
Acto 1
Uma mulher grávida, desempregada, com o marido desempregado, resolve consultar a segurança social para indagar sobre apoios pré-natais. A resposta foi afirmativa, pelo menos em teoria porque a experiência veio demonstrar que a mesma só bafejava os moribundos sociais.
Acontece que o meio de análise para a concessão deste apoio recai sobre os rendimentos apresentados na declaração de rendimentos do ano anterior, i.e., estávamos em Julho de 2014 mas o que interessava eram os rendimentos de 2013. Por conseguinte e porque nessa altura a situação laboral era completamente diferente o apoio foi indeferido, mesmo apresentando-se ao caso duas pessoas desempregadas, onde só uma recebia subsídio de desemprego de um valor pouco acima dos 600 euros.
A lógica aplicada era simples como o ano passado tinha andado a encher a mula de euros este ano não tinha direito a nada. Assim, devia tentar no ano seguinte quando já não estivesse grávida, ou então, devia pensar com antecedência essa coisa horrível de nome maternidade porque a Segurança Social não alimenta pançudos do passado.
Acto 2
Depois da experiência anterior a abordagem à Segurança Social tornou-se um culto ao cepticismo, ao ponto de um indivíduo ir a medo indagar se naquele presente e com aquela realidade merece aquele apoiozinho que os descontos deviam proporcionar.
A maternidade chegou, o ano é agora 2015, novo ano, novas perspectivas, nova declaração de rendimentos. A situação era diferente, um dos membros do casal já trabalhava, ainda que em regime de trabalhador independente, com rendimentos tão incertos quanto a natureza humana. Tinha chegado a altura de tentar novamente um apoio da Mãe Segurança Social, apoio esse que exigiu um plano estratégico. Tinha 6 meses para apresentar o pedido desde a maternidade, esta ocorrera no final do ano o que exigia que o mesmo fosse efectuado até ao final da primavera. Ora, como não podia correr o risco das mentes brilhantes da grande Mãe olharem para o fausto que me rodeara há dois anos, o segredo residiria no protelar do pedido e aguardar a nova entrega do IRS do ano imediatamente anterior. Não havia forma de falhar. Errado. Pois acontece que até final de Maio do presente ano os rendimentos tidos em conta são os relativos a 2013. Portanto estamos em 2015 mas o que conta é 2013, porque o abono pretendido é para um projecto de criança, por nascer, melhor por realizar, para o eu passado. Em algum momento estes cálculos terão feito sentido a quem pensou esta montruosidade e isso é que é assustador.
O que ressalvo destas experiências é que não só os "apoios" são cada vez menores como os obstáculos a eles são inversamente proporcionais. Isto não é um estado social, isto é um cenário muito bem caracterizado feito para parecer o que na realidade não é. Vazio de acções, vazio de consciência social, vazio de responsabilidade. A Mãe Segurança Social, não é mais que uma figura que abandona a descendência e que deixa órfã, sem escrúpulos, os filhos que a alimentaram. 34,75% do salário é quanto nos custa a besta com um retorno lamentável.
Apoios sociais? Poias sociais.
PAS
Regressando à minha rubrica - soa tão intelectual, uau! - "A propósito disto", apetece-me comentar a nova trend da juventude: Snifar Canela.
Muitos condenam esta nova moda entre os jovens iluminados da sociedade por personagens como Justin Biebers e Miley Cyrus. Apontam inclusive para os perigos do consumo, com alusões à asfixia e outros malefícios. Pois eu, visionária como sou, discordo. A canela é claramente a solução para a proliferação de vícios que grassa pela sociedade. Tem baixas calorias, não é por qualquer razão que várias pessoas recorrem à mesma como substituto do açúcar. Evita confusões com outras substâncias, como a cocaína - imaginem que ao invés da canela decidiam snifar açucar em pó, nem quero pensar na tragédia. Depois é sobejamente reconhecido que a canela é uma óptima especiaria para enaltecer a qualidade de certos alimentos, como o pastel de nata, o arroz doce, etc. porque não me lembro de mais nenhum, mas quem sabe se não produz o mesmo efeito no quoficiente de inteligência da "geração canela".
Enfim, com tudo isto resta-me condenar o alarmismo face ao consumo nasalado da canela. Eu por exemplo adoro alternar a canela com o Vicky, fica assim uma coisa tipo canela com menta. Maravilhoso.
PAS
Hoje tive o prazer de desfrutar do fenómeno da banalidade. Uma viagem de 30 minutos de autocarro acompanhada de intelectos de fazer inveja aos maiores cérebros da humanidade e quem sabe além.
Sentada no meu banco ergonomicamente deficiente, curiosamente para pessoas deficientes - sorry! - vejo-me, de supetão, encurralada por duas almas frívolas. Discutiam elas a eficiência das máquinas de lavar e secar, os quilos, a durabilidade, as marcas; enfim tudo o que de interessante pode surtir do contexto: "Ah! Quero comprar uma máquina de lavar e secar, mudo de máquina a cada 3/4 anos, não duram nada, são uma porcaria... em trinta anos já tive 5 máquinas de lavar", obviamente a senhora não sabia contar.
Já a companheira de tema retorquia: "A minha máquina é de lavar e secar, mas nunca a utilizei para secar... foi das primeiras a saírem com as duas funções, custou-me um dinheirão", eu pensei para mim, cá está mais uma manifestação de portuguesismo bacoco.
Interessada como estava na conversa e informada como nunca pela complexidade do universo das máquinas de lavar, e enquanto ouvia pela 5ª vez que a primeira personagem queria comprar uma máquina de lavar e secar, sou surpreendida pela entrada impetuosa - a pés juntos - de uma terceira interlocutora, estranha a todos. Diz ela cheia de propriedade: "Não compre! máquinas de lavar e secar são uma porcaria. Comprei a minha há dois anos e já está a dar problemas!", segundos depois de um silêncio estranho acrescenta, "peço desculpa meter-me na conversa, mas de facto a minha máquina é uma porcaria". As duas criaturas anuíram em respeito a mais uma fiel seguidora da religião consumista.
A minha paragem chegou e eu corri para a porta. No meu intimo desejei ser mais subtil na fuga. Questionei a minha feminidade, a minha capacidade de discutir assuntos mundanos como electrodomésticos. O momento atrapalhou o meu exercício mental por uns longos três segundos até cair no obsoleto e eu agradecer ao destino a falta de apelo por objectos tão adorados por passageiras da Carris.
PAS
Local: Brasileira
Comentário: Isto está entregue aos bichos!
Sim, o café chama-se Brasileira, mas como tudo o que se espera de inteligente, não tem que ser levado de forma literal. Isto porque, o estabelecimento, símbolo da Lisboa histórica e casa da magnífica escultura de Lagoa Henriques, dedicada ao maior poeta moderno português, está inundado (oferta dos constantes dias molhados) de empregados brasileiros e outros quejandos.
Ora, isto não seria problema se:
1. Os empregados fossem, independentemente da nacionalidade, competentes;
2. Os empregados fossem diligentes;
3. Os empregados nos tratassem como clientes e não como "gajos-que-vêm-dar-trabalho-a-quem-quer-estar-encostado-ao-balcão";
4. Se o produto servido fosse de uma qualidade tal que o serviço dos mesmos empregados fosse absolutamente obliterado pela gastronomia.
Como nenhum dos pontos acima se adequou ao contexto da visita, restou ao meu parceiro na empreitada o comentário: "Isto está entregue aos bichos!"
Sim, está. A Brasileira, como Portugal, está entregue aos bichos, quando os valores pelos quais se erigiram se desmontam numa retórica fria de procura de lucros desenfreados, sem contemplar a qualidade, a génese, o orgulho de ser português. O salário desumano e a exploração é hoje uma bandeira infinitamente superior à responsabilidade de representação de uma cultura. Que se lixe a cultura, que se lixe Lisboa, que se lixe Portugal!
Quando entro na Brasileira e ignoro o seu valor histórico em detrimento de um serviço de merda, com produtos de merda, e me pergunto: "Mas esta gente sabe que está a trabalhar n' A Brasileira?", assumo que fui comida por mais um bicho.
PAS
Há sempre ideias positivas a retirar de maus momentos. Como por exemplo, uma constipação do tamanho de Herodes - exactamente, Grande! - o que retirar dela? A voz. A capacidade de tornar uma voz linda, clara, diáfana numa voz de soprano, poderosa, quente, excepto nos momentos imediatamente a seguir ao espirro. Por estes dias, ando a cantar La Traviata como uma verdadeira Maria Callas.
PAS
Não é todos os dias que temos a oportunidade de nos despedirmos de 2013 e ver nascer 2014, de facto tenho quase certeza absoluta que só hoje é que o podemos fazer. UAU que privilégio!
Continuo sem saber como me despedir de um ano e dizer olá a outro, por isso copio a maior parte das pessoas e atiro para o ar umas palavras sem sentido, como "boas entradas", com esperança de que não pensem que estou a referir-me a uma eventual ausência de cabelo, sempre que me entregam o pão, o troco do combustível, o jornal...
Não é segredo para quem me conhece como eu me conheço, por isso é segredo para toda a gente, que esta data para mim é uma coisa fofinha que inventaram no tempo do Gregório e que entretanto transformaram em data santa para as Paris Hiltons do mundo poderem dançar em cima de colunas e dizer que ficou no passado.
Enfim, voltando ao modo humano, quero aproveitar esta data super especial - a minha querida avó Paterna, falecida há um par de anos, fazia anos neste dia - para desejar a todos os que têm o privilégio e o azar da minha presença dia após dia, semana a semana, mês... Vocês percebem, muita saúde e tempo para passar com quem mais amam, porque a vida é uma miríade de recordações e cabe-nos a nós expor-nos a ela, com lágrimas ou sorrisos, suor ou finesse, com amor ou dor, e sempre com a esperança de um futuro melhor.
PAS
Era uma vez uma mulher que tirava prazer apenas das pequenas coisas, gestos perdidos, como o de uma mãe a ajeitar o chapéu do filho antes de este entrar na escola, e numa fracção de segundo, quase silencioso, uma caricia que se perde no roçar da mão dela pela face do menino, é revelado como se um testemunho do seu amor ficasse gravado para eternidade. Eram apenas as pequenas coisas.
Um dia andava a incógnita pelas ruas de uma Lisboa molhada, pela bênção de S. Pedro, quando no reflexo de uma montra, decorada para as festas de Dezembro, a figura de uma rapariga a consternou. Era pequena, de tez branca, tão branca quanto a natureza do Inverno permitia, sardas saltavam do nariz para as bochechas como uma civilização em desenvolvimento, os olhos castanhos eram profundos como a inocência que brotava deles, e aquele corte de cabelo, de franja bem definida, era a divisão entre o quotidiano e a vida vivida. Sim, aquela criança era ela.
Aproximou-se do reflexo e tentou tocar-se, ignorando todas as leis da física e da lógica universal. Por qualquer razão ela sentia que o momento era superior a tudo o que era lógico e racional, a magia pairava naquele reflexo feito retrato da sua infância. Ao toque seguiu-se um vazio que a transportou à criança em si.
Era 1988, 24 de Dezembro, a noite era fria, como uma palavra dita sem eco. A mesa estava posta, pratos de fina porcelana e copos Cabernet brilhavam à luz de velas vermelhas, sobre uma toalha coberta de frutos secos e doces de época. Respirava-se Natal. A mãe cobria a azáfama com a sua diligência, “Está na hora”, dizia. Os presentes amontoavam-se metodicamente por baixo do nome de cada um. No seu volume de graças reparou num embrulho em particular, o entusiasmo infantil era difícil de controlar perante a dimensão do mesmo, era como que a antevisão de algo grandioso, algo mágico, algo capaz de apagar da mente de uma criança preocupações de adultos.
Não demorou muito até chegar a sua vez, era a segunda pessoa mais nova presente, e a tradição mandava que a árdua tarefa de revelar os anseios de uma época fossem feitos de forma crescente. Rapidamente a ânsia que morava no interior mascarada de esperança por objectos de desejo deu lugar à excitação da revelação. Deixou o presente que lhe aguçara a atenção para último, como que reservando a si não só prazer da descoberta como a vitória de um duelo entre a ignorância e a esperança por um objecto de valor.
Embrulhada estava uma guitarra-piano elétrica, vermelha, perfeita. A criança nela exultou. Ia, finalmente, poder acompanhar o pai nas suas sessões de música noturnas. Ia, finalmente, poder ser como o pai.
Na guitarra existia, para além dos elementos expectáveis da mesma, um botão com uma versão demo para ajudar a treinar dedos não educados. Ela premiu o botão e da guitarra soou uma versão instrumental da música “Last Christmas”, dos Wham, por razões que não soube explicar abraçou o instrumento como se um companheiro fosse, e deixou que a música a embalasse no sonho que o Natal sempre prometia. Olhou em volta e viu a mãe a sorrir e o pai orgulhoso. A mulher dentro da criança quis permanecer ali, naquele momento, para sempre. Onde a mãe sorria e o pai a olhava enquanto ela abraçava uma ideia. Afastou a guitarra de si e no vermelho vivo viu o seu reflexo, uma jovem mulher, de ombros curvados e abraçada a si por conta da intempérie. Fechou os olhos e gravou o momento, sabia sem perceber que a viagem terminara. Quando os abriu novamente estava de regresso à rua de onde partira, em frente a uma montra que agora reflectia somente a sua presença.
Respirou fundo e apertou-se ainda mais, como se ao frio se tivesse juntado a perda, mas, enquanto uma lágrima prometida escorria pela sua face, e uma catarse se manifestasse naquele lugar, compreendeu o sentido do evento.
Mais do que uma troca de presentes, mais do que uma reunião de família e amigos, mais do que uma celebração religiosa, o Natal era a celebração das memórias que o tempo oferecia com o selo da infinidade.
Com esta revelação, abriu um sorriso, e seguiu para casa iluminada e preparada para um novo Natal, com a imagem da mãe a sorrir e o pai a olhar com orgulho.
PAS
Feliz Natal a todos os presentes e ausentes. Que este dia vos traga acima de tudo sorrisos e novas recordações para este álbum de nome vida.
10 anos de amor
10 anos de ciúme
10 anos de conversas
10 anos de discussões
10 anos de abraços, carícias
10 anos de frio, sem calor
10 anos de gargalhadas
10 anos de mágoas
10 anos de devoção
10 anos de dedicação
10 anos de olhares trocados à margem do tempo, porque fomos nós que o criámos. E por cada olhar trocado vincamos a nossa história imperfeita com credo na perfeição. Somos um desde sempre, com 10 anos de razão.
PAS
Nos dias que correm a vida tem-se apresentado sucessivamente como um tabuleiro de xadrez. O passeio pelas brancas parece-me claro, etéreo, sem vestígios de dramas, um quadro perfeito da vida na terra sem o erro. No entanto estou forçada a deslocar-me pelo caminho negro, com o objectivo impossível de matar uma rainha inexistente, e com o mais que destino de vir a ser comida por um cavalo qualquer, que vive a vida sem pretensões de ser bem sucedido. Aguardo novo jogo, e novos dias.
PAS
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